No gin, no king!

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Antes do gin, o mundo não conhecia o alcoolismo. Até então, só existiam cerveja e vinho, ambos baixa porcentagem de teor alcoólico, à época.

A destilação moderna surgiu com a alquimia do século 14, mas, até o século 16, a produção e a venda eram restritas aos boticários, que fabricavam infusões com folhas, flores, cascas e sementes para torná-la mais palatável.

Na virada do século 18, Londres se firmava como maior cidade do Ocidente, capital financeira do mundo. Para aliviar a tensão, homens recorriam a prostitutas e ao gin. As mulheres, só ao gin. Em 1723, o consumo per capita da bebida – estatística que computa crianças e inválidos – era de 568 mililitros semanais – fenômeno batizado de gin craze, a “loucura do gin” (a imagem que ilustra este artigo é do famoso pintor William Hogarth retratando o estado miserável do centro de Londres em sua cópia de 1751, Gin Lane).

Entre 1729 e 1751, o Parlamento britânico promulgou leis para combater o consumo de gin. Os Gin Acts resultaram em revolta. A mais conhecida tinha até data marcada: 29 de setembro de 1736, dia de São Miguel Arcanjo. O motim, anunciado cinco dias antes, uniu toda a massa de pobres e oprimidos de Londres aos gritos de “no gin, no king” (“sem gin, sem rei”).  Para apoiar à causa, taverneiros ofereceram gin grátis durante a madrugada que antecedeu à rebelião. Foi um tiro no pé: Na manhã de São Miguel, ninguém apareceu.

Quando as autoridades decidiram combater o gin, encontraram uma rede estruturada de produção, distribuição, comércio e consumo, pois qualquer um era capaz de fazer gin, desde que tivesse acesso ao álcool que deveria ser redestilado (o gin é uma bebida feita a partir da redestilação de um álcool neutro – geralmente de cereais – na presença de vegetais aromáticos).

Como não tinha mais controle da situação, o governo foi relaxando a lei aos poucos. O último ato do gin estimulava a população a beber cerveja. Com isso, a produção da bebida foi sendo assumida por indústrias que pagavam impostos e repassavam o custo ao consumidor. O aumento de preços, então, freou o consumo de gin.

Mas se você pensa que a loucura do gin terminou, está enganado.

Um estudo recente da Universidade de Innsbruck, na Áustria identificou que as pessoas com grandes tendências antissociais e sádicas eram as maiores fãs… do gin!

Durante o teste, os pesquisadores avaliaram os elementos da personalidade que compõe o estereótipo da pessoa ruim. Os seguidores da chamada “dieta dos psicopatas” (que, além do gin, envolve outras bebidas e comidas amargas, como chocolate com alta porcentagem de cacau, café, água tônica e frutas cítricas, por exemplo) tiraram as notas mais altas indicando traços de personalidade chamados de “malévolos” e antissociais. A relação com a comida amarga era especialmente forte para os psicopatas e sadistas do dia a dia.

A explicação, segundo os cientistas, está em nossa evolução: o gosto amargo dá um alerta para o cérebro, que aprendeu ao longo de milhares de anos a associá-lo a veneno. Como uma das características renomadas dos psicopatas é que eles “não têm medo”, são mais frios em um momento tenso e, assim, conseguem gostar de bebidas e comidas amargas, já que o organismo não as rejeita como acontece com uma pessoa, digamos, “normal”.

Enquanto isso, a Inglaterra assiste a uma nova explosão do gin: em 2017, as vendas da bebida aumentaram para mais de um bilhão de Euros, enquanto o número de destilarias da bebida mais que dobrou no Reino Unido. A rainha que se cuide…

 

Fonte: Superinteressante